O óleo de coco é uma gordura pouco convencional nos países não-tropicais, mas uma alternativa saudável e funcional que pode substituir alguns óleos vegetais refinados típicos da dieta Ocidental. O facto de ser constituído maioritariamente por gordura saturada não o deverá assustar. Além disso, mais de 50% dos ácidos gordos presentes no coco são de cadeia média (MCFA), nomeadamente ácido láurico, formando aquilo a que chamamos MCTs (middle-chain triglycerides). Embora os estudos científicos em humanos com óleo de coco não sejam muitos, tanto os que existem como a lógica bioquímica indiciam um potencial interessante a nível de vários parâmetros de saúde como o controlo do peso e perfil lipídico, bem como uma potencial aplicação em nutrição desportiva.
O metabolismo e absorção dos ácidos gordos de cadeia média (MCFA) é
diferente dos convencionais, com cadeias carbonadas acima dos 16
carbonos. O azeite e a grande maioria dos óleos vegetais (girasol,
amendoim, milho, soja, etc) incluem maioritariamente ácidos gordos desta
categoria. Embora exista alguma controvérsia na classificação dos MCFA,
a maior parte dos autores considera-os entre os 6 e os 12 carbonos de
extensão. O ácido laúrico, constituinte principal do óleo de coco, tem
12 (12:0). A nomenclatura 12:0 diz respeito ao número de carbonos (12), e
ao número de insaturações (0). O ácido láurico é um ácido gordo
saturado com 12 carbonos.
Após absorção no intestino, os MCFA entram na circulação entero-hepática
directamente, não sendo transportados nos quilomicra através da linfa
como acontece com os ácidos gordos de cadeia longa (LCFA). Na verdade, o
ácido láurico parece ter propriedades de MCFA e LCFA, estando no limite
que separa estes dois tipos de lípidos. Ele é transportado directamente
do intestino para o fígado no sangue ligado à albumina, mas também nos
quilomicra em menor extensão.
Quando um ácido gordo de cadeia longa é absorvido, ele é transportando
pela linfa no canal torácico e depois entra na circulação periférica.
Como tal, antes de passarem pelo fígado, os LCFA passam pelo tecido
adiposo e músculo, onde podem ser reservados ou eventualmente oxidados,
embora isto raramente aconteça após uma refeição. Os MCFA, onde o ácido
láurico do óleo de coco se inclui, passam primeiramente pelo fígado e
não no tecido adiposo. Têm uma maior propensão a serem utilizados como
fonte de energia, e menor tendência a acumulação nas reservas de
gordura.
A oxidação rápida e extensa dos MCFA deve-se ao facto de não dependerem
da carnitina para entrar na mitocondria. A passagem dos ácidos gordos
entre membranas, nomeadamente através da membrana mitocondrial, é um
processo altamente regulado a nível metabólico. Na verdade, é o
mecanismo que trava a utilização de gordura como fonte energética quando
existem hidratos de carbono disponíveis. A acumulação de malonil-CoA
derivado do metabolismo da glicose inibe a CPT-1 (sistema de transporta
da carnitina), enzima responsável pela translocação dos ácidos gordos de
cadeia longa para dentro da mitocondria, onde só aí podem ser oxidados.
Ora, os MCFA são moléculas pequenas e difundem-se livremente pela
membrana mitocondrial, não estando sujeitos a este mecanismo regulador e
limitante da oxidação de ácidos gordos.
Se o fornecimento de MCFA ao fígado excede as necessidades e capacidade
de produzir energia do órgão, o acetil-CoA formado na beta-oxidação é
canalizado para a produção de corpos cetónicos. Estes podem então ser
utilizados como fonte de energia noutros tecidos, em conjunto com os
MCFA que escaparam o metabolismo hepático. Uma das implicações poderá
ser o efeito saciante e altamente energético que muitos verificam quando
ingerem uma dose significativa de MCTs, como o óleo de coco. Mas
exibindo características de MCFA e de LCFA em simultâneo, é possível que
o ácido láurico promova outros mecanismos indutores de saciedade mais
associados aos LCFA, nomeadamente a estimulação da CCK. Os MCFA parecem
também aumentar a termogénese, favorecendo um maior dispêndio energético
diário justificado pela sua elevada taxa de oxidação pouco regulada.
Não há muitos ensaios controlados que estudem o efeito do óleo de coco a
nível da perda de peso, embora o produto tenha sido altamente
publicitado para este efeito nos últimos tempos. Deu lugar às cetonas de
framboesa entre os produtos milagrosos que nada dão para além de
promessas, especialmente quando tomados como suplemento.
O óleo de coco não é um suplemento alimentar, é um alimento. Embora os
poucos ensaios efectuados tenham revelado resultados algo desanimadores,
alguns indiciam efeitos promissores. Por exemplo, um estudo publicado
há alguns dias mostra que combinação de MCTs e capsaicina (pimenta
vermelha) ingerida às refeições pode aumentar a termogénese (taxa
metabólica) em 50% . Embora se trate de um marcador indirecto da perda e gestão do peso, não me parece que deva ser ignorado.
As gorduras alimentares têm sido um dos principais focos de atenção por
parte dos investigadores dada a sua influência perfil lípido. No
entanto, o papel das gorduras alimentares no risco de doença coronária é
convencionalmente estimado através do seu impacto nos níveis de
colesterol total (CT), um parâmetro "inocente" que se tornou inimigo
público número 1. Por este motivo, gorduras ricas em ácidos gordos
saturados, especialmente de cadeia média como o ácido láurico (12:0),
têm sido vistos como perniciosos e a evitar numa dita “dieta saudável”.
As gorduras saturadas parecem aumentar o colesterol total do sangue de
uma forma inversamente proporcional ao tamanho da cadeia carbonada.
Dentro do paradigma que infelizmente persiste acerca do efeito do CT no
risco cardiovascular, é normalmente aconselhado minimizar a quantidade
de gorduras saturadas da dieta. No entanto, é importante ter também em
conta o seu efeito nos níveis de HDL-C e muitos estudos têm falhado
neste aspecto.
Os benefícios das HDL são geralmente atribuídos ao seu papel no
transporte reverso de colesterol, diminuindo assim o tamanho da placa
aterosclerótica e o risco de ruptura. No entanto, as HDL parecem exercer
múltiplas acções metabólicas no organismo que estão em concordância com
o papel protector que aparenta ter. Foram já descritas acções
anti-trombóticas, anti-inflamatórias e antioxidantes, bem como um efeito
regulador da função endotelial e hemodinâmica. No entanto, reparem que
falamos de partículas HDL e não do directamente colesterol que lhes está
associado. Dar importância ao colesterol em exclusivo é demasiado
redutor.
Uma meta-análise de 60 ensaios controlados e randomizados
veio elucidar acerca do efeito dos diferentes ácidos gordos dietéticos
nos parâmetros lipídicos do sangue. Apesar de todos os tipos de ácidos
gordos (saturados, mono e polinsaturados) aumentarem o HDL-C em
comparação com hidratos de carbono, o efeito das gorduras saturadas é
superior. Mesmo sendo o ácido láurico (12:0) o ácido gordo que mais
aumenta o CT, ele parece no entanto reduzir significativamente o rácio
CT:HDL-C. Isto indica-nos que o ácido láurico é extremamente eficaz em
aumentar os níveis de HDL-C no plasma e a maior parte do aumento do CT
está associado à fracção lipoproteica HDL. Na verdade, o rácio CT:HDL-C
parece ser mais fiável do que qualquer parâmetro lipidémico isoladamente
porque é também sensível à quantidade de colesterol presente nas
partículas VLDL, mais aterogénicas. A variação em 1 unidade do CT:HDL-C
parece estar associada a uma redução do risco cardiovascular em 53%,
o que quer que isto signifique. Já deve saber por agora o que eu acho
da relação causal entre o colesterol e a aterosclerose.
São escassos os estudos clínicos e de intervenção que avaliam o efeito
do óleo de coco nos níveis de HDL-C ou outros parâmetros lipidémicos.
Talvez o interesse sobre esta gordura exótica seja diminuto e a maioria
dos trabalhos cinge-se a equipas brasileiras e do Pacífico-Sul onde o
óleo de coco assume uma maior importância nos hábitos alimentares da
população. Nesses trabalhos, a ingestão de óleo de coco parece favorecer
um ligeiro aumento do HDL-C em indivíduos adultos, embora com fraca
expressão estatística . Estes resultados obtidos em humanos são consistentes com observações em modelos animais .
No entanto, esta associação tendencial nem sempre é verificada,
tratando-se de uma matéria controversa e ainda pouco estudada.
O óleo de coco virgem parece prevenir a oxidação das LDL in vitro,
um dos factores de risco mais relevantes para a iniciação e progressão
da lesão aterosclerótica, em contraste com o que se verifica com o óleo
refinado. A presença de polifenóis no óleo virgem pode explicar o efeito
protector da peroxidação lipídica. A actividade antioxidante do óleo de
coco virgem parece ser mais elevada comparativamente ao óleo refinado
devido ao maior teor em compostos fenólicos. O calor aplicado na
produção do óleo do coco refinado, mais de 200ºC, poderá destruir os
polifenóis e reduzir o seu potencial antioxidante. Assim, o processo de
extracção do óleo parece ser um factor determinante do potencial impacto
benéfico no organismo. A sua escolha deve sempre recair sobre o óleo
virgem.
Uma outra propriedade de interesse do óleo de coco é o seu provável
efeito anti-fúngico. Tem sido usado para o tratamento da candidíase
intestinal, por exemplo, com algum sucesso relatado, embora, mais uma
vez, os estudos científicos sejam inconclusivos. Não porque aleguem o
contrário, mas simplesmente porque ainda não foram feitos com o rigor
exigido. A monoleureína, derivada do ácido láurico, é tóxica para alguns
microorganismos e responsável pelo efeito fungicida atribuído ao óleo
de coco. Este também tem sido extensivamente usado para problemas
cutâneos infecciosos e fins estéticos.
A dieta tradicional dos países Ocidentais e industrializados, em
especial nas zonas não-tropicais, é praticamente isenta de ácidos gordos
de cadeia média. O coco é uma das poucas fontes naturais concentradas
de 12:0 e MCTs, constituindo cerca de 50% do óleo extraído da semente.
Vimos que existem motivos que justificam a introdução do óleo de coco na
nossa dieta, mas não em substituição de outras gorduras saudáveis como o
azeite. Não existe uma quantidade diária recomendável, mas tendo em
conta os estudos efectuados e a praticabilidade no quotidiano, 20-30g
(2-3 colheres de sopa) por dia é suficiente, facilmente adicionado aos
alimentos. Obviamente que deverá ter em conta o valor aditivo no aporte
calórico.
Pela minha experiência, tenho verificado a introdução de óleo de coco na
dieta, como veículo de MCTs, bastante interessante e cómoda. Tornou-se
indispensável na refeição pré-treino juntamente com proteína e hidratos
de carbono, fornecendo energia rápida e vigorosa sem qualquer
desconforto a nível gastrointestinal. No Inverno é mais complicado
porque o óleo de coco torna-se sólido abaixo de 25 ºC. Pela manhã tem um
efeito bastante saciante em associação a uma fonte proteica. Claro que
o óleo de coco virgem não fará nada só por si quando o objectivo é
optimizar a composição corporal, mas em sinergia com uma dieta e treino
optimizados, pode ter um papel funcional que se reflete nos seus
resultados.